Nicolau Maquiavel e Etienne La Boétie são autores do século XVI. Maquiavel escreveu O Príncipe em torno de 1513. E La Boétie escreveu Discurso da Servidão Voluntária por volta de 1534. Dois autores célebres com filosofias frontalmente opostas. Maquiavel coloca seu livro a serviço do poder abusivo dos príncipes. O livro de La Boétie insurge-se contra os tiranos. Mas o impressionante é que ambos são atualíssimos.
Maquiavel ensina como conquistar e manter o poder. Para alcançar o poder e submeter o povo, todos os meios são legítimos. O Príncipe dita normas para exercer o poder com astúcia. Com linguagem direta e sedutora, aponta truques políticos e métodos inescrupulosos que permitem anular adversários e subjugar o povo. Maquiavel reconhece que a liberdade é perigosa. E aconselha o Príncipe a suprimir a liberdade dos cidadãos, para não perder o poder.
La Boétie salienta o ser humano como pessoa inteligente e livre, como espécie racional situada acima da escala animal. Por isso, espanta-se ao verificar que o ser humano capitula, e abdica de sua dignidade e de sua liberdade. Não se conforma ao ver que o povo entrega o potencial de sua liberdade e de seus direitos aos que exercem o poder. Considera que, em geral, os tiranos são produtos da população habituada à submissão. Lamenta a conivência do povo que adere a políticos espertalhões, hipotecando-lhes apoio. Com isso, o povo debilita-se e fortalece o poder que o esmaga. Escreve La Boétie: “É surpreendente ver milhões e milhões de homens miseravelmente subjugados e de cabeça baixa, submissos ao jugo deplorável, porque são fascinados e enfeitiçados pelo nome de um que não deveriam temer”. Para La Boétie, a omissão e a tolerância do povo favorecem tiranias políticas e econômicas.
Maquiavel ensina como dominar o povo, enganando-o. E como imobilizá-lo, destruindo-lhe a liberdade. E disso temos fartos exemplos entre nós e no mundo. La Boétie ensina a mobilizar a liberdade contra a dominação imposta ao povo pelo hábito e pelo poder. A grande contribuição de La Boétie foi mostrar que o povo enterra sua liberdade para consolidar os desmandos políticos e econômicos. Infelizmente, o povo rende-se à magia do poder. E faz-se “voluntariamente” servo. É a “servidão voluntária” de que fala o livro de La Boétie. A demissão voluntária dos trabalhadores é um exemplo modelar da “servidão voluntária”. O cinismo da “globalização” desafia e humilha os trabalhadores: ou aderem “à demissão voluntária” ou serão despedidos impiedosamente. São livres e podem escolher. Mas, de qualquer forma, perderão o emprego. É a edição pós-moderna da “servidão Voluntária”.
Referência/Bibliográfica
ARDUINI, Juvenal – Antropologia: ousar para reinventar a humanidade – São Paulo: Editora Paulus, 2002.
Um comentário:
Meu caro, nunca li Boétie, mas você me desculpe creio que vc também não leu maquiável. Ele era um republicano e, portanto, foi morto. Seu livro é uma verdadeira escola da resistência popuplar por meio de um filosofar historicistas, o que se prova no tito lívio. Máquiável nunca ensinou a dominar mas contou a história e as estruturas da dominação para que o povo pudesse resistir.
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